Mandala
A vela estava acesa, o incenso já espiralava sua fumaça, naquele velho espaço, que sempre se tornava novo, livre e puro quando aqueles irmãos se sentavam em roda, e soavam seus instrumentos.
Ressonavam as cordas mais uma vez, e eu estava tenso. Sentia desde cedo uma vibração interna desagradavel...beirando a angustia.
Angustia essa acumulada de dias solitários. De dias sem muita vida, sem muito sentido. Sem muito sentir. Recusa de sonhar acordado, portanto volúpia de continuar dormindo.
Antes do primeiro rufar de tambores, a erva. Fazia algumas semanas que não sentia o seu aroma. A santa maria da musica...marijuana. Bons papos, porém...angustia.
A angustia tornou-se desespero, mas os tambores seguiram. Os indios vieram.
Pela primeira vez pude entender. E o verdadeiro entendimento é fruto da coragem, nunca se esqueçam disso.
Entendi a energia viva do luto, enlouquecedora memória afetiva do passado, perdida no espaço, vindo perdida de sentido...agradeci o velho Freud...deixei a memória abraçar o afeto e afundar novamente, através do peso natural das coisas compreendidas, rumo a vastidão inconsciente. Nisso brotou o amor, a luz da pura presença, do bem estar de quem foi abençoado por sobreviver a tempestades tão duras. A noite então seguiu maravilhosa. Chegaram novas energias. Digão...Gabi...e umas cervejas bem geladas.
"Quero ouvir a batida do teu coraçao, é musica, é a minha percussão. Teu corpo vai ser um belo instrumento, ar-fogo-terra-todos os elementos. Eu quero te tocar"
A energia fluiu tão bem...por horas e horas...a chama das almas queimava tristezas e angustias, decepções e raiva, ciumes e desejos, orgulhos e medos. Tudo tornava-se musica, vibração. Tudo se tornava conexão. Tudo que era passado e futuro virava presente momento. Tudo que era eu virava tu. Tudo que era tu virava eu. Eu virava tudo, e ainda estava contigo, ainda eu e tu. Eu e eles, parafraseando tu. Tudo.
É musica, é isso o que eu tenho pra oferecer de melhor, é onde sou totalmente. É o meu caminho. Minha musica quer te partir ao meio, te revelar a polpa do viver por detrás da casca. Minha musica quer ser atravessada pela tua, e que tu me mostres toda a tua beleza. Quero que ela seja uma forte viga mestra que sustente tuas energias mais pesadas. Quero que ela resista a tuas raivas e te acolha como um berço pro teu choro. Quero que ela alimente tua alma onde ela tem fome, e que sirva de terreno para tu plantar tuas sementes, e que teus frutos alimentem a alma dos outros com tuas virtudes, tantas, que aguardam apenas onde brotar e te surpreender. Teus filhos, teus renascimentos.
Se ainda há muito a percorrer....seguirei caminhando.
Se a muito a sofrer...sofrerei cantando
Se o amor quiser...amarei vibrando
Se musica não é coração, não vale de nada
Se a vida não é coração, é pagina virada
Em branco. Baixo e sem tom.
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Tem coisas que eu não entendo bem
Dentre elas, as pessoas que eu mais gosto
Que eu imagino que não me entendam também
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